"Ah! Esta noite é a noite dos vencidos!" (Augusto do Anjos)

O sol não queima há tanto tempo,
O vento de mim se esqueceu,
Preso em claustrofóbicos intentos,
Da ponte a sanidade esmoreceu

Pela cólera das erínias,
Ao sonhar fê-la etérea,
Pintando epifanias claras, exímias,
Com cores pálidas, funéreas

De tão aturdida,
A lira não ressoa uma nota,
Para que serve inda a vida,
Dentro desta pele gélida e morta?!

Toda inocência dorme lívida,
No frio que o vento esqueceu,
Em uma noute que parece perdida,
À espera do sol que nunca nasceu




 “E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...”, Florbela Espanca

Aprisionado em consentimento
Dorme um coração relutante
O céu plúmbeo esboroa lento
Copiosas lágrimas de infante

Quando o pesar bateu a porta,
Despetalando a canção de minh’alma?
Tocou no corpo cortantes notas
Como que esculpindo a pele em navalha

Teu sorriso meu enleio
Meu receio teu regozijo
D’ouro pintou meus devaneios
Na profundidade que preciso

Libertar-nos-emos dessas dores
Que nos volve aos labirintos ancestrais
Do tempo, memória e cores
Enquanto remontamos esquecidos umbrais